8 de fev. de 2008

As aventuras de um fotógrafo

Antonini Paraggi é o personagem de Italo Calvino que inicialmente desprezava a fotografia feita pelos domingueiros, aqueles a quem ele assim chamava, por nada entenderem de fotografia e apenas saberem manusear o equipamento, aproveitando-se dele para guardar os bons momentos da vida.
Em "Aventuras de um fotógrafo", texto contido em "Amores difíceis", Paraggi acaba indo do desprezo à obsessão pela fotografia, na busca por captar a essência de sua amada por meio desta técnica. Especializa-se, monta estúdio, compra mais e mais apetrechos e chega a divagar sobre a dificuldade de escolher apenas um momento e um ângulo determinado na continuidade do real, concluindo que a única maneira de preservar vivências seria disparar pelo menos uma foto por minuto. Passa então a fotografar a mulher ininterruptamente, sempre e a cada
instante, esteja ela dormindo, ao seu lado, caminhando, comendo, sozinha, perto ou longe. A obsessão faz com ela o deixe. Num ato de loucura, ele rasga todas as fotos e fotografa sua ausência, no lençol amassado, na cadeira vazia. E passa depois a fotografar as fotos rasgadas, dispostas sobre jornais, quase que emendando-as nas figuras do periódico diário. Feito isso, amplia e fotografa novamente numa eterna releitura e apropriação das imagens, como que criando novos passados a serem guardados e recontados no futuro.
O ritual absurdo do protagonista do conto remete meus questionamentos hoje ao volume de imagens que estão sendo "guardadas" em álbuns virtuais. A seleção atropelada dos momentos a serem devidamente "recortados" da realidade para a posteridade está cada vez mais próxima da obsessão de Antonini Paraggi, quando imaginou o ideal da fotografia minuto a minuto.
E a que critérios esta seleção obedece? Quais as conseqüências?
Já li em algum lugar que o excesso de informação, o excesso de imagens de nossos dias, poderia levar à banalização total e que, com esta overdose, estaríamos comprometendo definitivamente o filtro da memória e sua própria preservação. Será?
Fica para pensar...


PS: a propósito, a foto postada foi retirada do flickr, site de compatilhamento de imagens, escolhida aleatoriamente a partir de uma busca simples com a palavra "fotógrafo"

2 comentários:

Anônimo disse...

menina, por este texto vc já teria me ganhado, mas ainda teve mais tudo o restante que vi. Gostei muito desse presente aos amantes da fotografia. Já está nos meus favoritos, vou acompanhar sempre.

Anônimo disse...

e o que é que a gente faz? pára de fotografar? (rs) tô brincando! adorei blog, as fotos, os temas, tudo... sou sua fã, sempre!